segunda-feira, 14 de julho de 2025

O acolhimento ofertado pelas máquinas

Recentemente, eu estava bem estressada, com muitas coisas na cabeça. E, de repente, senti uma necessidade urgente de conversar, de desabafar de alguma forma. Não tinha ninguém com quem sentar e dividir aquilo, e mesmo que tivesse, eu não sou muito de me abrir com facilidade. Então, cometi uma das maiores "atrocidades terapêuticas" da atualidade: escrevi um texto repleto de desabafos super pessoais e o coloquei numa Inteligência Artificial. Para minha surpresa, recebi uma resposta boa, acolhedora, sem julgamentos, que de alguma forma aliviou o peso daquele estresse pulsante.

Foi estranho. Me senti como nos filmes de ficção científica, em que as máquinas começam a substituir os humanos. Mas, ao mesmo tempo, fiquei preocupada e sem entender muito bem o que estava acontecendo. Talvez o meu desespero por um acolhimento rápido tenha sido o gatilho para eu buscar consolo em algo tão impessoal. Um texto tão pessoal, algo que com certeza eu nunca mostraria a ninguém, estava ali, em uma IA. Isso me fez perceber, de uma forma um tanto desconcertante, o quanto eu estava "desesperada" a ponto de pedir socorro a uma máquina.

E então veio a segunda preocupação: o que acontece com os textos pessoais que são publicados para uma IA? Será que alguém lê? Fica arquivado? Ou simplesmente é deletado, como se nunca tivesse existido? Eu, com minha curiosidade habitual, fui pesquisar sobre o assunto e descobri algumas coisas interessantes sobre o uso da IA como ferramenta terapêutica nos dias de hoje.

É claro que a Inteligência Artificial foi criada para realizar tarefas técnicas, principalmente no ambiente de trabalho. No entanto, no último ano, com a popularização dessas ferramentas, vimos uma expansão enorme do seu uso — seja para trabalhos acadêmicos, seja para criar imagens, organizar tarefas diárias ou até mesmo realizar pesquisas simples (afinal, quem nunca abriu a IA em vez de pesquisar no Google?). Com esse crescimento, não seria surpresa que as IAs também começassem a ser usadas em áreas psicológicas, e, de fato, já existem muitas pessoas que utilizam essas ferramentas como suporte terapêutico.

Li que alguns optam pela IA por diversos motivos. A principal delas é a disponibilidade 24 horas por dia. Além disso, a IA não julga o desabafo sincero, oferece conselhos que podem ser estimulantes e, claro, envolve um custo bem mais baixo.

Apesar de eu ter cometido esse "absurdo", acredito que não precisa nem ser dito o quão problemático pode ser substituir uma terapia convencional — com um profissional real, que estudou para estar ali, pronto para dar o apoio adequado — pela chamada "terapia virtual". Eu sou totalmente contra essa substituição. O psicólogo real não pode ser substituído por máquinas, que, em sua maioria, oferecem respostas pré-fabricadas e, no máximo, fazem pequenas alterações de palavras para que a resposta não soe tão robótica. É claro que sempre vamos encontrar profissionais ruins em qualquer área, e isso também acontece na psicologia. Por isso, é importante buscar referências e escolher com cuidado o profissional com quem vamos trabalhar.

No entanto, não quero terminar esse pensamento apenas criticando as IAs. Acredito que elas são ferramentas poderosas e valiosas, que, se usadas corretamente, podem ser de grande ajuda. Eu mesma as utilizo bastante, especialmente para trabalho e estudos. Tenho uma visão bem pragmática: tudo o que foi criado para ajudar pode ser muito útil, desde que seja usado de forma responsável. Mas, se você usar a IA apenas por preguiça, está apenas se tornando mais um alienado, escapando do esforço real de aprender, refletir e, principalmente, se conectar com outras pessoas.

terça-feira, 8 de julho de 2025

Definição de Sozinho

Abro, mais uma vez, o aplicativo de relacionamentos — esse hábito quase automático que insiste em me lembrar que há algo fora do meu controle: o tempo passando, as pessoas se encontrando, e eu... bem, eu ainda aqui. Sozinha.

"Qual é, afinal, a definição de 'sozinho'?" — pergunto em silêncio, mas a dúvida pulsa alto demais. Não resisto e digito no buscador, como se o dicionário pudesse me oferecer algum consolo:

Sozinho – adj.
Absolutamente só. Isolado de tudo. Sem companhia. Acompanhado de apenas uma outra pessoa. Que não conta com auxílio material ou moral de ninguém. Não ajudado por ninguém. Que é único. Consigo mesmo.

Consigo mesmo.
Essa parte me pega.
Ser sozinho é ser... consigo mesmo?

Sento para escrever algo — talvez um texto, um desabafo, um pedaço de mim. Tento transformar essa solidão em força, em manifesto. Começo com a velha ideia de liberdade: a delícia de não ter que dar satisfações a ninguém, de poder ir e vir, de viver por si. Um egoísmo quase charmoso, desses que a gente aprende a defender como liberdade. Mas a verdade, mesmo que a contragosto, escapa entre os dedos: a solidão tem dias bons, sim, mas há noites em que tudo que eu queria era encostar a cabeça no ombro de alguém. Só isso. Não um grande amor, não um enredo cinematográfico. Apenas um silêncio compartilhado.

Não é desespero. É cansaço.

O problema é que minha única experiência de amor foi um naufrágio. Tóxico. Abusivo. Um amor que se disfarçava de necessidade, que me dopava com mentiras e me fazia acreditar que minha existência era pequena demais pra caber sozinha. Um amor que me ensinou a duvidar de mim. E como esquecer isso? Como confiar de novo quando tudo que se lembra é o gosto amargo de ser manipulada?

O tempo passou, é verdade. Mas a voz interna ainda cochicha que eu não sou digna de amor. Que não há nada em mim que valha ser escolhido. E quando, por acaso, alguém se aproxima, é como se um alarme disparasse. Me escondo no papel de amiga, fujo antes que algo floresça. Finjo indiferença — é mais seguro assim.

Às vezes me pergunto se essa vai ser minha história. Se é isso que sobrou pra mim: viver sozinha. E então, quase como uma resposta tardia, uma centelha acende. Talvez não seja uma sentença. Talvez seja só uma fase. Uma travessia. E quem sabe, sem eu perceber, alguém chegue. Não como salvador, mas como companhia. Alguém que escolha caminhar ao meu lado, e não me empurrar para o fundo.

Mas aí vem a realidade crua: já se vão quase seis anos solteira. Relações rápidas, passageiras, encontros que duram uma noite e somem pela manhã. Onde está o futuro nisso? Como reconhecer o que é real quando tudo se desfaz antes mesmo de começar?

Respiro fundo.

A verdade é que estou aqui. Sozinha. No sentido mais completo da palavra. E talvez seja hora de aceitar isso com menos drama e mais honestidade. Este é meu momento, minha versão de agora. Não preciso me punir pelo passado nem me apressar por um futuro que não chegou. Preciso apenas viver — um dia de cada vez — e parar de esperar que alguma parte da minha solidão seja resgatada por outro alguém.

Só que, cá entre nós, esse debate interno é cansativo. Quase cômico, se não fosse tão real. Preciso trabalhar, tenho coisas pra fazer, e essa conversa fora de hora na minha cabeça não ajuda em nada.

Chega. Silêncio.

Por hoje, viver basta.

terça-feira, 1 de julho de 2025

Nunca houve nada de errado comigo

Esse texto é dedicado à minha pequena eu.
Para uma menina de 7 ou 8 anos que vivia sozinha, não sabia fazer amigos, sofria bullying e acreditava que havia algo de errado com ela.

Pequena eu, o mundo sempre foi duro com quem, de alguma forma, está fora da curva. Você não tinha — e nunca teve — nada de errado. Se hoje, com 30 anos, eu tivesse o poder de voltar no tempo, te abraçaria forte e diria o quanto você sempre foi incrível. O quanto você foi forte. E o quanto, hoje, eu tenho orgulho de você.

Pode parecer estranho começar assim...
Bom, eu sempre deixei claro que sou uma pessoa fora do padrão. Nunca sei o que é certo dizer, não sei como devo me comportar, odeio contato físico e, às vezes, travo verdadeiras lutas internas entre o que penso, o que me ensinaram e no que realmente acredito.

Nunca foi fácil ser a criança diferente. Eu precisei, sozinha, observar ao redor, analisar o comportamento esperado e imitá-lo — só assim eu conseguia me encaixar minimamente no que a sociedade pedia. Mas me encaixar socialmente não significa que minha mente se encaixava. Essas batalhas internas são silenciosas, mas profundas... e costumam deixar marcas em quem luta.

E eu ainda carrego essas marcas. Algumas eu tatuei por cima. Ao olhar para elas, sinto um misto de orgulho e tristeza. Orgulho, porque atravessei esse vale. Tristeza, pela dor que senti durante o caminho.

Ser quem eu sou ainda me confunde. Mesmo hoje, essa confusão permanece.
Eu quero — e sempre vou querer — ser quem realmente sou. Não quero mais olhar ao redor e imitar o que os outros fazem só para me encaixar. Claro, aprendi que certos comportamentos e falas podem soar ríspidos, duros ou até mal-educados. Mas eu não vou vestir a roupa da moda só para ser aceita. Não vou fingir que amo as músicas do momento só para ser convidada para festas.

Eu sou quem eu sou. Me visto para me sentir bem. Escuto o que me faz bem. E, dentro dos limites do respeito e da educação, me comporto de forma alinhada com o que me faz bem.

É verdade: anos fingindo me fizeram perder, por um tempo, o senso de quem eu era. Mas, hoje, mergulhada nessa aventura de autodescoberta, tenho me encontrado. Me entendo muito mais do que há alguns anos.

Pequena eu, você foi incrível.
E hoje, sendo eu mesma, encontrei amigos, encontrei roupas que amo, músicas que me representam...
Encontrei nós no meio do caos.

E está tudo bem em ser fora da curva.
Você — nós — nunca fomos padrão.
E a força que temos hoje é algo para se orgulhar.

terça-feira, 24 de junho de 2025

Eu não sei ser mãe

Dizem que, quando nasce uma criança, nasce também uma mãe. Mas o que raramente nos contam é que tornar-se mãe não significa, automaticamente, saber ser mãe. A maternidade não chega com manual, nem com respostas prontas. Ela se constrói no dia a dia, no improviso, na dúvida, no erro e na descoberta. É um caminho muitas vezes difícil — e, para algumas, até doloroso.

Eu ainda estou tentando entender o que significa ser mãe. Tive e ainda tenho, até certo ponto, o apoio da minha família. Mas esse apoio vem cheio de altos e baixos. É como se as pessoas que já passaram por esse processo — que já criaram seus filhos — acreditassem que sabem tudo, e que eu, por estar começando, não sou capaz de aprender por conta própria. Talvez elas saibam algumas coisas mesmo. Mas há outras que eu quero descobrir sozinha.

Tenho minhas ideias, opiniões e meu jeito... um pouco fora do comum. Nunca fui uma pessoa “normal” — seja lá o que isso signifique — e, por isso, nunca imaginei que seria uma mãe dentro dos padrões. Sempre quis ser uma mãe mais aberta, mais disponível, mas também alguém que respeita a individualidade da criança. Quero que minha filha descubra seus próprios gostos, suas próprias ideias, que se torne quem ela quiser ser.

Talvez eu pense assim porque não tive essa liberdade. Fui criada em um ambiente com regras rígidas, em que tudo era definido entre certo e errado com base em um contexto religioso. O certo era o que a igreja dizia; o errado era tudo que fugia disso. Cresci sem espaço para me descobrir, sem incentivo para me aceitar como sou. E, mesmo hoje, sendo uma mulher adulta, ainda é difícil lidar com os conflitos entre o que aprendi e o que realmente acredito.

Além disso, fui criada de forma extremamente dependente — e agora, dar meus próprios passos, criar minha filha com autonomia, tem sido um desafio imenso.

O que desejo para ela vai além de ensinar valores como caráter, compaixão e fidelidade. Quero que ela aprenda a se entender, a se descobrir, a se aceitar. Acima de tudo, quero que cresça livre e independente. E ainda assim, quero ser, enquanto eu viver, o porto seguro para o qual ela sempre poderá voltar.

Sei que tudo isso parece bonito — até meio poético ou brega — mas colocar em prática é outra história. Às vezes, me sinto perdida. Sou uma pessoa difícil, tenho meus limites, meus dias ruins, minhas palavras duras... e ainda moro na mesma casa que a minha mãe.

E esse é, talvez, um dos maiores desafios: ser mãe enquanto ainda sou filha. Na mesma casa. Sob o mesmo teto. Claro, minha mãe tem sua experiência, e não digo que ela tenha falhado — pelo contrário, reconheço o quanto ela foi, e ainda é, uma boa mãe. Mas eu quero criar minha filha do meu jeito. Da forma que considero justa, sensível, equilibrada. E não conforme o que os outros acham certo.

Eu não sei ser mãe. Mas quero aprender. Quero descobrir esse caminho dentro das minhas próprias ideias, das minhas crenças e da forma como vejo o mundo. Porque ninguém nasce sabendo. Descobrimos vivendo. E a maternidade é uma dessas jornadas avassaladoras — que nunca é igual para duas pessoas, nem para uma mesma mulher com filhos diferentes.

O que sei é que esse caminho pode ser cheio de surpresas. Lindo, transformador… e, ao mesmo tempo, profundamente doloroso.


segunda-feira, 9 de junho de 2025

Os Tormentos de Estar Doente na Vida Adulta

Esses últimos dias têm sido bem complicados para mim. Muita coisa aconteceu em um curto espaço de tempo, e minha saúde acabou sentindo os efeitos — em grande parte, por causa de uma combinação de medicações. Já faço uso contínuo de remédios controlados para tratamento neurológico (não sei se já comentei isso por aqui), e, recentemente, precisei tomar antibióticos para tratar uma sinusite. A interação entre os medicamentos foi, literalmente, uma bomba para o meu corpo.

No meio desse caos, fui forçada a parar. Precisei ficar de cama por alguns dias, tentando me recuperar. E, nesse tempo em que o corpo enfraquece, a mente insiste em vagar. Me vi fazendo questionamentos um tanto filosóficos sobre quem eu sou e para onde estou indo.

Esse texto, aliás, nasceu sem muito propósito. Comecei a escrever com a esperança de que alguma inspiração surgisse e me desse um tema central. A verdade é que senti apenas a necessidade de colocar tudo para fora — escrever como forma de alívio.

Estar doente na fase adulta, ao contrário do que se pensa, não é apenas desconfortável. É quase um filme de terror. Quando criança, ficar doente também era ruim, claro — mas havia algo de reconfortante na atenção que se recebia. Sempre fui uma criança invisível, daquelas que não causavam preocupação, que passavam despercebidas até na própria história. E, justamente por isso, às vezes até achava interessante esse momentâneo protagonismo causado por uma febre ou dor de garganta.

Hoje em dia, no entanto, tudo mudou. Ficar de cama é um tormento. Detesto ser o centro das atenções, tenho mil pendências para resolver, trabalhos da faculdade acumulando, provas chegando... sem falar que sou mãe solo. Parar simplesmente não é uma opção viável. Mas, como nem tudo está sob meu controle, me resta tentar me recuperar da melhor forma possível para que a vida volte a andar.

É impressionante como a gente só percebe o valor da saúde quando a perde. No ritmo acelerado do cotidiano, esquecemos o quanto é essencial simplesmente estar bem. Como dizem os mais velhos: só damos valor quando perdemos.

E, pensando bem, aqui está o tema deste texto: os desafios de estar doente na fase adulta e o valor que damos às coisas apenas quando elas nos faltam. Esse assunto daria um texto longo, cheio de reflexões existenciais, críticas sociais, talvez até com algumas frases motivacionais. Mas, sendo bem sincera, não tenho energia para tanto hoje.

É uma noite de segunda-feira. Ainda sinto dores até nas pontas dos dedos. Só quero voltar a me sentir bem.

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Silêncios que gritam e também escrevem

Silêncios... Uma única palavra, mas que carrega um peso imenso sobre tudo o que eu vivo.

Às vezes, o silêncio não está nas coisas que deixamos de dizer. Ele se esconde, sutilmente, nas palavras que foram ditas — mas que carregam entrelinhas, ecos, e sentimentos mal disfarçados. Fico me perguntando com certa frequência: o que significa, de fato, um silêncio? E mais... onde é que eu deposito os meus silêncios?

Existe até uma piada interna sobre mim mesma: costumo dizer que minha mente nunca se cala. Em todos os momentos, há dez versões de mim coexistindo, cada uma gritando algo diferente, todas em desacordo, todas tentando assumir o controle. É engraçado... mas também é verdade.

Não existe silêncio dentro de mim. O meu silêncio é apenas a superfície. Lá dentro, tudo se movimenta, colide, questiona. Meu silêncio não é ausência — é disfarce.

Às vezes, me pergunto: como lidar com alguém que simplesmente não consegue se acalmar, que precisa de movimento constante, que nunca relaxa por completo? Essa pergunta me acompanha há anos — e, honestamente, ainda não encontrei a resposta.

O silêncio faz morada no meu exterior. Ele aparece nas observações que faço, na forma como me retraio, na maneira como fico quieta nos cantos. Mas não habita minha mente. Ali, tudo gira em desordem. Um eterno turbilhão de pensamentos que se atropelam, se enfrentam, se misturam.

Confesso: tenho medo do meu silêncio. Porque é justamente nesses momentos que me sinto mais caótica por dentro. Quando o mundo ao redor se cala, parece que tudo dentro de mim grita ainda mais alto.

Não sou — e talvez nunca tenha sido — alguém que se abre com facilidade. Em algum ponto da história deste blog, devo ter comentado como é difícil para mim mostrar o que realmente sinto. Sempre fui uma pessoa que fala muito... mas raramente digo o que está, de fato, dentro de mim.

Sei bem: os meus silêncios são gritos não gritados.

Talvez tudo isso não faça sentido. Talvez seja só mais uma tentativa de entender algo que nem eu mesma consigo explicar. Mas, curiosamente, há instantes em que encontro uma pequena pausa nesse ruído interno: quando escrevo, como agora. Ou quando escuto aquela música da minha banda favorita. É nesses momentos que uma espécie de calmaria me visita — mesmo que seja breve, mesmo que seja frágil. Um instante de paz numa mente tão amontoada.

Gostaria de dizer que essa tranquilidade também mora na minha casa. Mas, se existe um lugar que está longe de ser silencioso, esse lugar é o meu lar. Tudo ali é embaralhado, atravessado, confuso. Invejável é quem encontra no próprio lar um refúgio. A mim, resta procurar o silêncio em outros cantos — na escrita, na música, nos pensamentos que, vez ou outra, conseguem se alinhar.

E assim sigo: tentando fazer as pazes com os meus silêncios — os que falo, os que escondo e os que ainda estou aprendendo a escutar.

domingo, 25 de maio de 2025

Como me ensinaram a me odiar (e como tento desaprender)

Quando eu era criança, sonhava em ser bailarina. Amava balé. Amava ainda mais ginástica rítmica. Era o meu grande sonho: subir nos palcos, competir, ser reconhecida dentro daquele universo que parecia tão mágico. Mas, como acontece com muitos sonhos infantis, esse também ficou pelo caminho. E tudo bem... ou, pelo menos, era isso que eu tentava acreditar. Na época, achei que aceitar a desistência era o suficiente. Mas, com o tempo, percebi que algumas coisas deixam marcas profundas — principalmente quando tocam direto na forma como a gente se enxerga.

Nunca fui o tipo de menina que as pessoas olham duas vezes na rua. Nunca fui considerada bonita, muito menos impactante. Sempre fui "a amiga estranha" de alguém linda demais. A comparação era constante — mesmo quando ninguém dizia nada, ela existia. E quando diziam… bem, doía.

Desde que me entendo por gente, estou acima do peso. Sempre tinha alguém para comentar sobre isso. Quando não era um parente, era alguém da ginástica. Com o tempo, aprendi que existia algo errado em mim. Não porque eu achava isso, mas porque me ensinaram assim. E foi aí que tudo começou a desandar.

Depois que deixei o balé e a ginástica, continuei lutando com o espelho — e, pior ainda, com a balança. A relação com meu corpo virou um campo de guerra. E, sem perceber, fui entrando em um transtorno alimentar. Primeiro, comecei a pular refeições. Um dia sem comer, depois dois. Até que vinha aquela explosão de ansiedade, raiva, frustração… e eu comia em dobro. E depois vomitava tudo. Era um ciclo. Um ciclo doentio, silencioso — e, por muito tempo, invisível até para mim mesma.

Todos esses anos de conflito com o corpo, somados aos traumas e à cobrança estética constante, criaram uma bagagem emocional que carrego até hoje. Me tornei uma adulta cheia de inseguranças. E, infelizmente, essa ainda é a minha realidade.

Gostaria de dizer que aprendi a lidar com minhas imperfeições. Que me aceitei. Que superei. Mas não seria verdade. Estou acima do peso. Luto diariamente contra a depressão. Tento fazer as coisas funcionarem sem entender muito bem como. Sei que não existe uma solução mágica. Resolver tudo de uma vez é impossível. Mas talvez, por partes, seja possível.

Uma parte de mim quer aprender a lidar com minhas imperfeições. Outra parte quer mudar tudo agora. Quero resultados imediatos, mas também sei que só emagrecer não resolve. Eu poderia perder 50kg e, mesmo assim, continuar sem conseguir me olhar no espelho. É difícil ter tanta coisa pra resolver e, ao mesmo tempo, se sentir estagnada — sem conseguir fazer algo que realmente traga algum efeito.